13 de maio: dia de refletir e protestar, não de comemorar

Há exatos 132 anos, o Brasil assinava a Lei Áurea, que aboliu oficialmente a escravidão no país. No entanto, o 13 de maio não é celebrado pela maioria dos movimentos negros. É uma data para protestar, refletir e desmitificar a história contada ao longo do anos.

Quando a princesa Isabel assinou a Lei Áurea, para atender as necessidades políticas e econômicas, que nada tinham a ver com o bem estar da população negra, e a pressão social causada pelos movimentos abolicionistas, segundo dados do censo 1872, único censo oficial disponível, próximo à época da “abolição”, a maioria dos negros, cerca 74%, já estavam libertos, ou seja, aproximadamente 26% dos negros ainda mantinham a chamada relação servil.

Muito antes de 13 de maio de 1888, a população negra já organizava movimentos de resistência e conquistavam suas alforrias por seu próprio esforço e organização. As irmandades de cor, o papel decisivo das escravas de ganho, na compra de alforrias, além das rebeliões nas senzalas, formação dos quilombos, Revolta dos Malês, Balaiada, Sabinada e Cabanagem são só alguns dos exemplos do protagonismo dos negros escravizados na conquista da liberdade.

De lá para cá, muita coisa mudou. Outras nem tanto. A Lei Aurea é considerada o marco  oficial do fim da escravidão, no entanto, o Estado brasileiro além de não se responsabilizar em promover a inclusão social e econômica dos negros na sociedade, ainda manteve leis explícitas de exclusão dessa grande parcela da sociedade. Ainda hoje, o racismo estrutural garante a manutenção das desigualdades sociais com base na racialização das relações.

O Estado brasileiro não deixou a população negra à própria sorte, como muitos costumam afirmar, pelo contrário tratou de criar barreiras para impedir o avanço na sociedade, por meio do arcabouço normativo das suas instituições e do reforço dos preconceitos, através das literaturas e outras manifestações da culturas ativamente promovidas para naturalizar as discriminações e responsabilizar as populações oprimidas por seus infortúnios.

O avanço da dilapidação dos direitos sociais e especialmente os direitos trabalhistas, que se acelerou desde o golpe de 2016, demonstra explicitamente a regressão no campo das relações no mercado de trabalho, o mote proposto pelo desgoverno Bolsonaro, “ou emprego ou direito” é uma expressão emblemática da chamada, ” escravidão moderna” e a Carteira Verde Amarela é a chancela estatal do aprofundamento da exploração e da desigualdade nessa arena. Se negros e negras já eram os mais afetados pelo desemprego, trabalho precário e desigualdades salariais, essa situação certamente aumenta o abismo social entre negros e brancos.

De acordo com pesquisa do IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística), em 2019 os brancos eram 44,8% da população ocupada, pardos 43,7% e os pretos 10,4%. O salário das pessoas brancas (R$ 2.999) foi maior do que o pago aos pardos (R$ 1.719) e pretos (R$ 1.673). Os brancos ganharam 29,9% a mais do que a média nacional (R$ 2.308), e os pardos e pretos receberam 25,5% e 27,5%, a menos do que a média.

A chamada “guerra às drogas” e os mecanismos legais criados para subsidiá-la são a assinatura da permissão oficial para o assassinato de milhares de jovens negros. Desse modo, um homem negro tem 2,7 mais chances de ser vítima de assassinato do que um branco.

Atualmente, a crise provocada pela pandemia causada pelo novo coronavírus tem acentuado desigualdades existentes no mercado de trabalho.

Mulheres e negros são os mais atingidos pela crise. Em geral, têm vínculos empregatícios mais instáveis ou porque trabalham em atividades econômicas que foram mais afetadas pelo avanço da Covid-19.

Dados do Ministério da Saúde revelam que o coronavírus é mais letal entre a população negra. A quantidade de negros que morrem por Covid-19 no Brasil quintuplicou. De 11 a 26 de abril, os óbitos saltaram de 180 para mais de 930.

O número de negros hospitalizados por  SRAG (Síndrome Respiratória Aguda Grave) causada por coronavírus aumentou para 5,5 vezes. Representam 36,4% das internações, mas 45,3% dos óbitos por Covid.

Respeitar as orientações de distanciamento social também é um desafio, sobretudo, porque muitos estão nas áreas periféricas, com alta densidade populacional. Em alguns casos, sem acesso a serviços básicos, como saneamento e água corrente.

Nesse momento a determinação da fila única para acesso aos leitos destinados ao tratamento de pacientes com Covid-19 é fundamental para impedir mais uma face da desigualdade. Grande parte dos negros que adoece depende do SUS (Sistema Único de Saúde) para tratamento. Estudos apontam que 67% dos brasileiros que não têm recursos para acessar o serviço privado de saúde são negros.

Diante do cenário de calamidade pública, são os hospitais públicos e o Sistema Único de Saúde, a ponta de lança no combate a pandemia. É preciso garantir que todas as vidas sejam tratadas com dignidade.

A luta contra o racismo está longe de ter fim, é preciso fortalecer os corpos e reforçar as almas, a liberdade é uma conquista diária e a população negra é protagonista da sua história.