Mônica Neri: Superlotação é o grande desafio da Maternidade Climério de Oliveira

Em entrevista à Assufba Sindicato, a superintendente da Ebserh, Mônica Neri, responsável pela Maternidade Climério de Oliveira (MCO), falou sobre a atual situação da maternidade, dos profissionais de saúde e dos pacientes, com a superlotação registrada na unidade hospitalar. Segundo ela, é necessário um esforço conjunto entre as mais diversas instâncias, para que sejam tomadas providências e soluções sobre a questão. Confira a entrevista abaixo: 

Assufba Sindicato: Há alguns dias, a superlotação na MCO foi objeto de matéria no Fantástico. Qual a avaliação sobre esse fato?

Mônica Neri: Para quem não conhece nossa realidade diária, não se aprofundou no assunto ou apenas fez uma análise superficial, fica a impressão de que na Maternidade Climério de Oliveira as pacientes são atendidas de maneira incorreta, em cadeiras e amontoadas. Mas se você analisa criteriosamente a reportagem, percebe que foi abordada a falta de acessibilidade nos serviços de urgência e emergência da rede pública do Estado como um todo, resultando na superlotação da nossa maternidade, que mesmo tendo ou não vagas, acolhe essas pacientes que já percorreram outras unidades e não conseguiram atendimento.

A matéria ressalta isso, que a Maternidade Climério de Oliveira, a mais antiga do país e que tem uma estrutura física desafiadora, ainda assim se coloca à disposição da sociedade para fazer o acolhimento de todas as pacientes que “batem a sua porta”, de acordo com o que é preconizado pelo Ministério da Saúde em uma de suas políticas prioritárias de assistência e proteção à saúde, que é a Rede Cegonha. Na fala do nosso representante na reportagem foi colocado que tomamos a decisão de acolher as pacientes independentemente de vaga, por isso na Climério de Oliveira as pacientes sabem que serão atendidas. Digo isso porque vivenciamos sobre a dificuldade de acolhimento em outros lugares.

A superlotação ainda é uma realidade. Mas temos buscado iniciativas como notificar as instâncias pertinentes que podem tomar decisões políticas e de gestão em nível de rede, para resolver ou minimizar essa questão. Notificamos as Secretarias de Saúde do Estado e do Município, Conselhos Estadual e Municipal de Saúde, Cremeb, Coren, Sindimed, Sociedade de Obstetrícia e Ginecologia, a Reitoria da UFBA e a Ebserh. Todas as instâncias estão notificadas e sendo informadas sobre o que estamos enfrentando.

Assufba Sindicato: De que forma a UFBA tem tratado a questão da maternidade?

Mônica Neri: A UFBA tem nos dado apoio muito importante. Recentemente, a Reitoria promoveu uma sessão pública onde todas as instâncias citadas anteriormente foram convidadas e compareceram para debatermos sobre a assistência na rede, com as participações também dos Ministérios Públicos Federal e Estadual. Foi um momento muito positivo, de ampla discussão. Desse encontro foi criada a Comissão de Acompanhamento da Situação Obstétrica no Estado da Bahia, que é coordenada pelo MP Estadual.

A primeira reunião aconteceu no dia 15 de fevereiro e a próxima será realizada no dia 21 de março, para que sejam avaliadas as ações nesse intervalo de tempo das Secretarias de Saúde do Estado e do Município com soluções em curto prazo para que possamos minimizar esses riscos de vulnerabilidade para as pacientes, para os profissionais de saúde, para a gestão da Maternidade e instituições como um todo. É um problema desafiador, mas que precisa ser enfrentado.

Assufba Sindicato: Qual é a situação atual da maternidade?

Mônica Neri: O grande desafio hoje da Climério, que extrapola até a questão da estrutura física centenária, é a superlotação. Nós temos um quadro profissional que se equilibrou bastante com o último concurso realizado, temos um corpo extremamente qualificado de profissionais, realizamos capacitações tanto na área administrativa quanto na área assistencial, mas a superlotação tem sido um fator desafiador para que a gente possa garantir qualidade e segurança na assistência ao paciente, qualidade no ensino e a possibilidade de pesquisa e inovação.

A questão da superlotação é um desafio não só para a assistência em si, mas também para a gestão. Porque às vezes, deixamos de nos ocupar com questões mais pertinentes a situação da maternidade, que é promover ensino, pesquisa, produção de conhecimento com uma assistência de excelência, que é o que a gente busca prestar à sociedade.

Nosso objetivo como maternidade escola é servir de campo de prática. Os profissionais que estejam aqui precisam ter acesso a melhor condição de assistência baseada nas boas práticas, na humanização, numa ambiência segura e tranquila. Então, nós temos que ser o modelo para que a partir desse aprendizado o profissional saia daqui com qualificação suficiente para prestar uma boa assistência em qualquer unidade de saúde do país.

Além de qualificar e capacitar esses profissionais, temos um objetivo imenso que é a questão de produzir novos conhecimentos através da pesquisa, de inovar processos, de inovar com propostas de resolução. Estamos agora com um desafio grande em relação à microcefalia com provável associação com o Zika vírus. Esse é também um desafio e papel da maternidade se envolver fortemente na busca de solução para essa questão que se apresenta desafiadora para o país inteiro e o mundo.

Nós estamos nos integrando em processos de pesquisa, muitos deles alinhados com o Hospital das Clínicas, para que as gestantes com suspeita ou quadro clínico de alguma exantema (manchas no corpo), que possam ter relação clínica com Zika, Dengue ou Chikungunya, sejam acompanhadas na maternidade. A partir daí se faz uma avaliação para saber se os bebês apresentam alguma alteração durante a gestação para que, ao nascerem, se confirme ou não se desenvolveram microcefalia.

Caso se confirme, eles entram em um protocolo de investigação para analisar se essa microcefalia tem relação com a Zika, sendo acompanhado pelo Hospital das Clínicas. Após a avaliação e investigação, nós já estamos em conversa com a Secretaria de Saúde do Estado para que, numa rede mapeada, esses pacientes possam ser acompanhados por outras unidades de saúde.

Assufba Sindicato: E os trabalhadores? Qual a situação deles em relação às condições de trabalho e carga horária?

Mônica Neri: Eles têm uma carga horária definida e isso é respeitado. A questão é que a sobrecarga de pacientes realmente leva a exaustão muitas vezes desses profissionais de saúde, que por trabalhar numa unidade de urgência e emergência, numa unidade obstétrica que lida com o nascer da vida, isso é realmente estressante e vulnerabiliza esses profissionais.

Não falo agora nem no ponto de vista profissional, mas no ponto de vista físico e emocional, porque quando fazemos o dimensionamento ele é baseado na capacidade instalada, no quantitativo de leitos e serviços que podemos disponibilizar.

Então, se esse quantitativo de pacientes é multiplicado, a acomodação é em poltrona, cadeira e maca. Mas não temos a multiplicação dos profissionais. Eles têm de se desdobrar para garantir a assistência aos pacientes excedentes, com toda atenção e vigilância possível para que se possa garantir qualidade e segurança.

Mas a verdade é que essa qualidade e segurança são vulnerabilizadas por essa situação. Então existe o desgaste e, pode estar acontecendo adoecimentos, porque o plantão é realmente mais exaustivo e isso pode levar a um desgaste físico, mental e emocional desses profissionais, pois a situação não tem sido pontual, se fosse um caso pontual de o profissional ter tido um plantão exaustivo, na semana seguinte já volta ao normal.

Infelizmente, essa situação tem se repetido, mas nós estamos muito atentos para que isso não persista dessa forma. Estamos buscando junto com as secretarias de Saúde do Estado e do Município um debate amplo com as estâncias envolvidas, a própria Reitoria, o Damed e o DCE tem participado das discussões, o corpo docente e o corpo discente, a representação sindical e as instâncias que podem resolver isso, como os Ministérios Públicos Federal e Estadual, que visam defender o direito do cidadão. Todos nós temos discutido e buscado soluções para resolver isso.

A Climério de Oliveira se coloca a disposição das instâncias propondo soluções. Agora, o desafio é garantir a qualidade da assistência e segurança dos pacientes. Temos buscado unir todos os esforços para minimizar todo e qualquer risco, mas o fato é que existe um excedente e excessivo de pacientes, que leva a um desgaste dos profissionais, além de vulnerabilidade para os mesmos, para a assistência ao paciente e para a gestão do ponto de vista médico, cível e penal.