Em pronunciamento no Congresso Nacional, Alice Portugal faz balanço da situação da população negra no Brasil

Nesta quarta-feira (20), Dia Nacional da Consciência Negra, a deputada Alice Portugal discursou na tribuna da Câmara. Deputada citou dados de pesquisa do Ipea que atestam a segregação do negro no País e manifestou o seu apoio às políticas de cotas raciais e sociais como forma de reparação a populações historicamente alijadas do processo de desenvolvimento do País.
Senhor presidente, senhoras deputadas e senhores deputados,
O Dia Nacional da Consciência Negra comemorado neste 20 de novembro de 2013 ocorre sob o impacto da divulgação de estudo realizado pelo Instituto Nacional de Pesquisa Aplicada – IPEA, que revela revoltantes dados sobre violência contra negros no Brasil.
Tal estudo, somado a outros indicadores medidos pelo IBGE e outros órgãos de pesquisa, mostram que no dia que foi escolhido para ser o Dia Nacional da Consciência Negra os brasileiros muito pouco tem o que comemorar nesta cruzada secular contra o racismo em nosso país. Ele está arraigado nas instituições, nas relações sociais, no ambiente familiar, na escola, no trabalho e mesmo no subconsciente de milhões que juram não ter qualquer tipo de preconceito. E as consequências do racismo presente em nosso país, embora negado por muitos, caem pesadamente contra a população afrodescendente provocando vida degradada para milhões, mortes prematuras, subemprego, doenças, dificuldades de acesso à saúde pública e à escola de qualidade.
Trata-se, na verdade, de uma discriminação dupla que recai sobre a população negra do Brasil: pela cor de sua pele e por sua condição social. Discrimina-se o negro por ser negro e por ser pobre.
É necessário destacar que, nos últimos anos, a adoção de política de ações afirmativas por parte do Poder Público tem contribuído para ampliar oportunidades e resgatar uma pequena parte da imensa dívida social que o país tem para com a população afrodescendente. A política de cotas para ingresso nas universidades públicas demonstrou-se uma iniciativa vitoriosa e seus resultados positivos, medidos através do sucesso no desempenho dos alunos cotistas, desmontam todos os argumentos daqueles que foram contra as cotas e chegaram a tentar barrá-las na Justiça como fez determinado partido político.
Tais iniciativas pontuais do poder público marcam alguns avanços para os negros na luta pela igualdade na cidadania. As cotas para ingresso no Serviço Público, recentemente anunciadas pela presidenta Dilma, apontam no caminho desses avanços sociais e, por esta razão, sofrem ferrenha oposição das elites e de seus meios de comunicação.
O estudo do IPEA divulgado na semana nacional da Consciência Negra traz números assombrosos e desalentadores.
A Bahia, cuja capital, Salvador, é a maior cidade negra fora da África, com 51,7% de negros ou pardos, e onde o bairro da Liberdade é o maior bairro negro da América Latina, ostenta números que mostram o quão cruel é para o negro viver em um país onde, cento e vinte cinco anos após o fim da escravidão, ainda impera o preconceito racial.
O Estudo divulgado nesta terça-feira (19) pelo Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea) aponta a Bahia na quinta posição em perda de expectativa de vida para homens negros.
Os dados são apresentados no trabalho “Vidas Perdidas e Racismo no Brasil”, que coloca também o estado na sexta posição em homicídios contra negros em todo o país, com um percentual de 47,3 para cada cem mil pessoas, enquanto entre os não negros o índice é de 11,3 para cem mil. No caso de perda de expectativa de vida para não brancos, a Bahia fica na 18ª colocação.
O Estudo calcula impactos de mortes violentas (acidentes de trânsito, homicídio, suicídio, entre outros) na expectativa de vida de negros e não negros, baseados no Sistema de informações sobre Mortalidade (SIM/MS) e no Censo Demográfico do IBGE de 2010.
No mesmo período, enquanto a taxa de homicídios de negros é de 36 mortes por 100 mil negros em todo país, a mesma medida para os não negros é de 15,2. Para cada homicídio de não negro, são assassinados outros 2,4 negros.
Ainda de acordo com o levantamento, entre 1996 e 2010, foi constatado que não só características socioeconômicas, a exemplo de escolaridade, gênero, idade e estado civil, são determinantes em mortes violentas, mas também a cor da pele. A pesquisa diz que a vítima “quando preta ou parda, faz aumentar a probabilidade do mesmo ter sofrido homicídio em cerca de oito pontos percentuais”.
Mapa da Violência 2012, divulgado em outubro último pela Secretaria de Políticas de Promoção da Igualdade Racial da Presidência da República, revelou que 5.069 afrodescendentes foram assassinados na Bahia em 2010. Número representa aumento de 300% em comparação a 2002.
Outro estudo recente do Departamento Intersindical de Estatística e Estudos Socioeconômicos (Dieese) revelou a desigualdade no mercado de trabalho em Salvador. Segundo a pesquisa, o salário médio dos negros chega a ser 36,1% a menos do que os trabalhadores não negros.
Ainda de acordo com o Dieese, em Salvador, em 2012, o rendimento médio real dos ocupados negros diminuiu (3,2%), enquanto o dos nãonegros permaneceu relativamente estável (-0,1%). Os valores desses rendimentos passaram, entre 2011 e 2012, de R$ 1.077 a R$ 1.043, e de R$ 1.727 para R$ 1.726,00, respectivamente. Os homens negros registraram a maior perda de rendimento (de R$ 1.230 para R$ 1.179) no período analisado.
Que neste Dia Nacional da Consciência Negra, dia de Zumbi dos Palmares, saudar os movimentos sociais que lutam contra o preconceito racial e em defesa de políticas reparadoras por parte do Estado para que seja resgatada a imensa dívida social para com os afrodescendentes. Quero ainda manifestar meu integral apoio às políticas de cotas raciais e cotas sociais que estão sendo implementadas com amplo sucesso no Brasil, a despeito da ferrenha oposição das elites.
Viva o Dia Nacional da Consciência Negra!
Viva o herói Zumbi dos Palmares!
Deputada federal Alice Portugal (PCdoB-BA)